O Ministério Público Federal (MPF) solicitou à Justiça Federal em Belo Horizonte, Minas Gerais, a concessão de tutela de urgência para garantir a adoção de medidas que resguardem a saúde da população de Colatina, no Noroeste do Espírito Santo, com objetivo de evitar consumo de água fora dos padrões de potabilidade. A cidade está localizada na Bacia do Rio Doce, que teve as águas contaminadas por rejeitos após o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, em novembro de 2015.
Na manifestação enviada à Justiça no dia 5 de julho, o MPF reiterou os pedidos feitos nas alegações finais do processo. Entre eles, a suspensão da captação de água do Rio Doce para distribuição em Colatina, pois ela teria se tornado imprópria para o consumo após o rompimento da barragem de Fundão e com a chegada da pluma de rejeitos ao estado capixaba (veja as medidas solicitadas no final do texto).
Conduta da Samarco poluiu Rio Doce de maneira intensa
A manifestação do MPF ressaltou ainda que “a conduta da Samarco não somente poluiu de maneira intensa e perene o Rio Doce, como agravou de forma altamente relevante outros impactos já existentes, perpetuando-os”.
Isso porque, segundo o laudo pericial, para tratamento e limpeza da água, a empresa forneceu ao Serviço Colatinense de Saneamento (Sanear) produtos coagulantes e floculantes, em especial, o Tanfloc SG, que acabou por implicar novo risco à saúde humana.
O Tanfloc SG é um coagulante auxiliar utilizado no tratamento de águas em geral e de efluentes industriais. O uso do produto químico teria sido sugerido e fornecido pela Samarco para municípios afetados pelo desastre.
De acordo com o laudo, nas Estações de Tratamento de Água de Colatina, a dosagem utilizada do Tanfloc não cumpriu o previsto na norma ABNT NBR 15.784/2014, “em quadro de incalculável perigo”. Segundo os peritos, o produto pode causar perda de peso e neoplasias, sendo classificado pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer como carcinogênico, tumorigênico e teratogênico.
“Tais malefícios são causados pelos resíduos de formaldeído, usado como uns dos reagentes químicos no processo de fabricação do floculante, sendo normal que o processo de reação química não seja completo, deixando resquícios dos reagentes”, assevera o documento.
Os testes apontaram que todas as dosagens testadas do Tanfloc SG foram maiores do que a dosagem máxima recomendada de 10 mg/l.
“A utilização do Tanfloc para o tratamento da água no município de Colatina ocorreu completamente a esmo, sem a adoção de quaisquer providências de controle da qualidade da água após o tratamento para consumo humano, o que pode explicar a utilização de dosagens tão elevadas do produto na maior parte do período de aplicação”, apontou o laudo.
Veja as medidas solicitadas na cautela de urgência:
- Que a justiça obrigue o Sanear a interromper a distribuição de água fora dos padrões de potabilidade definidos pelo Conama e pelo Ministério da Saúde.
- Conclusão e implantação dos projetos de captação alternativa ao Rio Doce, suficientes para o abastecimento do município com água não contaminada bem como a adequação de todas as estações de tratamento a fim de assegurar condições operacionais efetivas e seguras para o cuidado com a água.
- Que a União e a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) cumpram com sua obrigação de fiscalizar devidamente a qualidade da água e os serviços prestados pelo Sanear em Colatina.
- Que a Prefeitura de Colatina, com aporte financeiro da empresa Samarco, adote medidas de acompanhamento da saúde da população, visando a detecção precoce e a prevenção de doenças relacionadas à exposição e ao consumo da água contaminada.
A Samarco informou ao g1 apenas que “presta os devidos esclarecimentos nos autos do processo”.
Já o Serviço Colatinense de Saneamento de Colatina (Sanear) disse que “a captação e o tratamento da água são monitorados por equipe técnica que realiza exames mensais sobre a qualidade da água na bacia do Rio Doce, e a situação da água após o tratamento realizado pelo Sanear”.
O órgão disse ainda que os resultados são acompanhados pela Vigilância Sanitária e regulados pela ANA (Agência Nacional de Águas). Os dados também são divulgados para os moradores da cidade no Portal da Transparência do Município.
“Atualmente, a Samarco não financia nenhum programa para monitorar a saúde da população de Colatina. Até o momento, a prefeitura já teve aprovado o montante de R$ 53.385.308,99 junto ao Comitê Interfederativo (CIF), que aprova os projetos encaminhados pelos municípios. Porém, até agora, esse dinheiro não chegou à prefeitura. Esse recurso, quando chegar, será utilizado em 34 projetos e obras que visam melhorar o tratamento de água e a coleta de esgoto na cidade”, completou.
A Fundação Renova, que administra as ações de recuperação do rio, disse que não vai comentar o caso porque a ação está em discussão na justiça.
Procurada pela reportagem, a Prefeitura de Colatina não retornou até a publicação desta reportagem.
Com informações do G1
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